03 marzo, 2004

Nampula - Tráfico de órgãos agita Moçambique

2004-03-03 00:00:00
AQUI, A IMPRENSA JÁ PERDEU O MEDO

O cada vez mais complicado caso do tráfico de órgãos está a agitar Moçambique, sobretudo depois de representantes da Igreja terem admitido que a crise existe e de o Conselho Permanente da Conferência dos Institutos de Religiosos e Religiosas terem escrito uma carta ao presidente Joaquim Chissano, insurgindo-se contra a apatia das autoridades.

arquivo cm

As crianças moçambicanas estão na mira dos traficantes de órgãos
Um clima de suspeição e desconfiança que foi sublinhado pelo padre Arlindo Pinto. Mas o missionário comboniano, há sete anos no país, revelou ao Correio da Manhã algum optimismo, considerando que o momento é de viragem na Comunicação Social moçambicana, que, finalmente, “perdeu o medo”.

“O grande elemento novo que surgiu nos últimos dias é que a Imprensa moçambicana perdeu o medo. Antes, tocavam ou mordiam o isco, mas não deitavam nada cá para fora. Agora, começaram a fazê-lo, com todas as letras”, afirmou aquele missionário em Nampula, contactado pelo CM. O sacerdote católico confirmou a existência de “casos de crianças desaparecidas e pessoas assassinadas”. “Algumas foram enterradas depois de ter sido consumado o homicídio, enquanto os cadáveres de outras foram deixados à superfície”, referiu. No entanto, o padre Pinto ressalvou que ainda não é possível saber, verdadeiramente, “quem está por detrás” e as verdadeiras razões dos crimes.

Aliás, o missionário Arlindo Pinto diz saber que “as pessoas que estão mais próximas dos acontecimentos” garantem que a questão tem sido abordada de forma “muito superficial e apressada”.

CASAL SUSPEITO

“Trata-se de um caso de Polícia e da alçada da Procuradoria-Geral, que estão ambos em cima dos acontecimentos, já que enviaram várias equipas de investigação para o terreno”, afirmou, para logo em seguida tecer críticas à forma como a questão tem sido tratada: “Muitos políticos – e a própria Polícia – só agora é que estão preocupados com o caso, após terem sido pressionados por esta vaga internacional e nacional”. “ Eu não sou polícia...”, adiantou ainda, quando questionado sobre um casal – ele sul-africano, conhecido como o Branco, ela dinamarquesa – que, alegadamente, tem sido apontado como o “líder” do desaparecimento de crianças e tráfico de órgãos humanos. Todavia, afirmou que “não é só o casal, mas uma rede”. O referido casal – que já foi detido e libertado – habita numa fazenda, concedida pelo Estado, em Nampula.

Aliás, o Conselho Permanente dos Institutos Religiosos, que apelou a um jejum, no dia 24, em memória das vítimas, afirma que o referido casal está por detrás da tentativa de venda, por um jovem, Dionísio da Silva Armindo, de uma criança de nove anos pela quantia de 3200 euros. Os responsáveis católicos voltam a afirmar que têm sido alvo de várias ameaças e intimidações .

MISSIONÁRIOS DESCONFIAM DA ISENÇÃO DAS AUTORIDADES

Entre os missionários e as missionárias da região de Nampula é convicção geral que este tipo de tráfico de órgãos humanos não só existe há muito tempo, como continua no momento presente, pelo que estes religiosos não confiam totalmente na seriedade e isenção das autoridades locais.

Quem o afirma é um missionário do Espírito Santo, padre Manuel Durães Barbosa, director das Obras Missionárias Pontifícias em Portugal, com íntimas ligações à Santa Sé através da Congregação da Evangelização dos Povos. O padre Barbosa, actualmente secretário da Comissão Episcopal das Missões, afecta ao Episcopado português, afirmou ainda que “tem acompanhado, com apreensão, as denúncias das irmãs brasileiras” e lamenta o facto de as autoridades de Nampula não terem sido até agora “mais eficientes”. Importa sobretudo sublinhar – acrescentou o missionário – o facto de a Igreja, a nível do Episcopado de Moçambique, ter lançado “um apelo muito forte ao governo para que o assunto seja levado mais a sério, devido à sua revoltante gravidade”.

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